terça-feira, 29 de março de 2016

Nº 19.007 - "Entrevista exclusiva com Guilherme Simões Reis, cientista político da Unirio"

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29/03/2016

 

Entrevista exclusiva com Guilherme Simões Reis, cientista político da Unirio

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Como vocês sabem, quase todas as grandes universidades brasileiras estão se mobilizando contra o golpe: diariamente há debates, seminários, manifestos e movimentações de todo o tipo, pela normalidade democrática e contra a violência política inaudita de desrespeitar o voto da maioria dos eleitores, provocando perigosíssima ruptura institucional.

Agora entendo porque imediatamente após o golpe de 1964, o regime militar interviu nas universidades, cassando professores, expulsando alunos e estabelecendo uma censura destruidora, que iria desmantelar por muitos anos a inteligência e a pesquisa acadêmica nacional: universidades são focos de inteligência, e tanto em 1964 quanto hoje, são os ambientes onde o golpe é primeiramente desmascarado.

A Unirio, uma das federais presentes no estado do Rio, também está se mobilizando contra o golpe. Nesta quarta-feira, dia 30, às 17:00, haverá um ato/debate por lá, na Sala Cinza - Jardim do Clã,  para lançar oficialmente o comitê antigolpe da instituição.

O Cafezinho conversou com um dos articuladores do comitê anti-golpe da Unirio.

Eis a entrevista:

Cafezinho: Algumas palavras sobre sua formação.
Sou doutor em Ciência Política pelo IESP-UERJ, professor da Escola de Ciência Política da UNIRIO e também do mestrado em Direito na universidade. Nossa Escola de Ciência Política, inclusive, emitiu nota firme contra o golpe, que contou com a adesão de todo o nosso corpo docente e com o apoio dos alunos representados pelo Centro Acadêmico e pela Associação Atlética. Atualmente leciono Formas e Sistemas de Governo, Sistemas Eleitorais e Instituições Políticas Comparadas. Durante meu doutorado, fui pesquisador visitante na Universidade de Frankfurt, na Alemanha. Venho participando de vários congressos internacionais e nacionais de ciência política e áreas afins nos últimos dez anos. Em minha tese, discuti o conceito de social-democracia e o apliquei a diferentes países da América do Sul e da Europa.

Cafezinho: Na sua opinião, o que está acontecendo no Brasil, hoje?
O Brasil vive hoje um momento dramático de sua história pós-redemocratização, em que nossa democracia, que vinha se consolidando, corre sério risco de sofrer nova ruptura, justamente quando o debate era sobre seu aprofundamento. Contrariamente argumentos frouxos, com o de que impeachment não pode ser considerado golpe porque está previsto na Constituição, ou forçados, como o de que as "pedaladas fiscais" configurariam crime de responsabilidade, o que há é o uso de um expediente que é constitucional mas de forma ilegal, pela falta de quaisquer evidências de crimes comuns ou de responsabilidade, para retirar do poder uma presidente eleita democraticamente ainda no meio de seu mandato. Isso não se dá mais por meio de golpe militar, como foi comum no continente, mas na forma de golpe branco ou golpe paraguaio, isto é, de impeachment irregular com o aval de um Judiciário conivente, tal como se passou com Fernando Lugo no Paraguai.

Cafezinho: Quem ou que forças políticas estão por trás da tentativa de
derrubar o governo?

Há claramente um conluio da "grande mídia" com o Judiciário, apoiados pelos segmentos mais reacionários do Legislativo e financiados por setores do empresariado, como a FIESP, e ao que parece, também por capital estrangeiro. Uma das principais razões é claramente a intenção de nova investida neoliberal, considerando-se as já exageradas concessões do governo como insuficientes, mas com a percepção de que tal projeto tem dificuldades crônicas de se viabilizar eleitoralmente, isto é, pela via democrática. Por outro lado, é claro que há também cálculos mais imediatos de poder pessoal, como o de Michel Temer, que não seria capaz de vencer uma eleição desse porte, e dos principais líderes tucanos, que perderam quatro eleições seguidas para o PT, e também de se aproveitar a distração para avançar na agenda conservadora no Legislativo, capitaneada por Eduardo Cunha. Tudo o que não move os atores centrais nesta empreitada, por mais que seja este o mote midiático, é o combate à corrupção. Isso fica óbvio pela forma seletiva com que se dão as investigações e pelo "currículo" dos envolvidos. O Judiciário, aliás, tem violado vários princípios do direito, inclusive o da presunção de inocência, o que é inadmissível. A atuação partidarizada e irresponsável da imprensa hegemônica, por sua vez, é responsável direta pelo aumento da violência política na sociedade.

Cafezinho: Em caso de golpe, como a sociedade brasileira deverá reagir?
Acho que a forma como a sociedade deverá reagir em caso de golpe é a mesma com que ela deve hoje agir às vésperas dele. As pessoas devem comparecer em massa às manifestações legalistas pela democracia, independentemente de como se posicionem em relação ao atual governo, e os movimentos organizados precisam se manifestar sempre. É fantástico como os movimentos sociais, as universidades, as categorias profissionais, artísticas, acadêmicas têm realizado atos, produzido abaixo-assinados, emitido notas contra o golpe, pressionando os deputados. Em editorial recente, um dos jornais que vem apoiando o pseudoimpeachment, o Estado de S. Paulo, atacou Guilherme Boulos, o MTST e o MST por suas declarações de que o país pararia se houvesse o golpe. Pois é exatamente assim que os movimentos sociais devem atuar: mostrar capacidade de mobilização e fazer o alerta antes do golpe, para que os golpistas não se sintam à vontade para levar a derrubada da democracia adiante. A instabilidade não interessa a ninguém, nem aos empresários mais conservadores, que podem não gostar do PT, mas gostam ainda menos de ter prejuízo. Se ainda assim eles atentarem contra a democracia, acho que não resta alternativa à população que não a de tentar inviabilizar o governo ilegítimo que tiver emergido. Temo que, nesse momento, a repressão militar será grande. É aterrorizante que algumas elites insistam nesta irresponsabilidade depois de o país ter vivido todo aquele terror pós-64.


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Guilherme Simões Reis
 
 

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