terça-feira, 26 de novembro de 2013

Contraponto 12.754 - "Gregório Grisa rebate Veja sobre as cotas raciais"


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26/11/2013


Gregório Grisa rebate Veja sobre as cotas raciais

 

Do Viomundo - publicado em 26 de novembro de 2013 às 9:29




segunda-feira, novembro 25, 2013

“Veja” cada vez mais “nítida” (Sobre as cotas)

por Gregório Grisa, no Augere

A coerência da revista Veja com sua filiação ao pensamento liberal-conservador tem sido gigante. Em uma reportagem (link) sobre ensino superior, intitulada “O drama de estudantes – e famílias – afetados pelas cotas” a revista mostra a vida de famílias que pagam os estudos dos seus filhos em escolas privadas e agora estariam sendo “prejudicadas” pela Lei da Cotas nas instituições federais, que prevê que até 2016, 50% das vagas desses estabelecimentos de ensino devem ser reservadas a estudantes que fizeram todo o Ensino Médio em escolas públicas.

Sem rodeios devo dizer que a reportagem só consegue enganar ou sensibilizar ingênuos ou leigos completos. Em um atentado a lógica e a qualquer estudo teórico sério na área da educação, a reportagem se utiliza de artifícios e argumentos pueris, construção de retórica oportunista e desonesta.

1 — Utiliza-se de exceções (casos de pessoas com bolsas em escolas privadas) para criar e induzir uma falsa regra, que chama de “drama” de milhares. Culpabiliza uma política e a quem ela atende pelo “sofrimento” das famílias da matéria.

2 — Busca explicar o todo ao apresentar a parte. Na frase que se diz “Como aluna de escola privada, ela só terá direito a disputar a metade das vagas restantes.”, tenta apresentar como injusto o fato de 50% das vagas para alunos de escolas privadas. Vamos ao todo, no Brasil 88% das matrículas do Ensino Médio são públicas e 12% são em instituições privadas. Historicamente, a ocupação das universidades federais se dava em sua ampla maioria por alunos de escolas privadas.

3 — Depois de depreciar o ensino público brasileiro, Veja questiona como a política de cotas irá melhorar esse mesmo ensino básico público, como se a função dessa política, do ponto de vista prático, fosse essa. Tentativa de reforçar aquele argumento batido de que “o problema é o ensino básico que tem que melhorar”, argumento descontextualizado que tenta usar do não feito para não fazer. Cotas não exclui em nada melhorias na educação básica, pelo contrário, pressiona para tal.

4 — A ideologia da meritocracia, calcada em uma realidade de fantasia, da conquista de estima social por via puramente individual, guia a reportagem, no trecho metade das vagas “não serão mais ocupadas segundo o mérito acadêmico dos candidatos”, despreza -se toda concorrência, mérito, esforço que há no universo de, no mínimo, 88% dos alunos de escolas públicas que irão disputar as vagas. Cenário bem mais “competitivo” que se ficasse somente com os estudantes de escolas privadas. Argumento preconceituoso e mal intencionado.

5 — Por que mal intencionado? Por uma questão simples que também remete ao todo da questão. No Brasil, 27% das vagas no ensino superior são públicas, dessas 56% são nas instituições federais, as quais cobrem as cotas. Falamos, mais ou menos, de 2 pedaços em uma pizza de 12 fatias, em uma metáfora rápida, as cotas ainda são metade disso, isto é 1 pedaço. 7 milhões disputando 120 mil vagas não há concorrência ou mérito nessa disputa? Já que tanto louvam esses valores.

6 — Os defensores do setor privado na educação (pois a entendem como serviço e não como direito) retratam o revés que as cotas estão causando na vida de estudantes de escolas privadas. Esses sempre ocuparam a universidade federal e vão continuar ocupando, desproporcionalmente, pois são 12% das matrículas e terão 50% das vagas. E a lei trata apenas de exigência de ensino médio no sistema público, isto é, quem fez o ensino fundamental em uma escola privada poderá concorrer pelas cotas.

O desespero de preservar privilégios que traduz tudo o que produz a revista Veja é alarmante, não pela ofensa que faz à inteligência das pessoas, mas porque vivemos num país injusto e desigual que precisa de muito mais. Imaginamos se mudanças substantivas ocorrerem o que será capaz de fazer esse meio de comunicação se diante de mudanças pequenas e pontuais já faz esse papel tão baixo e mesquinho.

Os sacrifícios das famílias narrados na reportagem são transformados em bodes expiatórios para tocar as pessoas e convencê-las de que a realidade é a soma de decisões e esforços individuais. Valor sublime do liberalismo, o individualismo alçado a proporções inimagináveis, a realidade é bem mais difícil de explicar que isso.

Essas famílias sonham e investem em seus filhos, ótimo, esses têm seus lugares reservados há muitos anos e seguirão tendo. Com as cotas, estamos falando de quem até então nunca sonhou nem pode investir na educação dos filhos, de quem pela primeira vez na história de sua família pode pensar em outra possibilidade a não ser trabalhar em sub-empregos e viver sub-felicidades.

Vocês podem perguntar porque tu ainda lês a Veja e dás importância para as bobagens que são publicadas. Bom, faço isso porque minha disputa agora, na vida é de ideias. Porque essa revista é postada por conhecidos meus, porque ela está na maioria dos consultórios médicos do Brasil e em repartições públicas e porque as pessoas vão ao médico e, em repartições, elas esperam, leem e eu, com muitos companheiros/as tenho que disputar a ideologia dessas pessoas com essa péssima revista.

*Dados são dos últimos Censos, do Ensino Superior e do Ensino Médio.


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