terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Contraponto 7336 - "Liberdade para copiar e para ter criatividade"

.
.31/01/2012
Liberdade para copiar e para ter criatividade

Jornal O Povo (CE) 28/01/2012

Riverson Rios*

"O que é preciso é uma lei que proteja o autor, que garanta seu sustento com a propriedade intelectual "

Houve um tempo, quando ainda não se conjugava o verbo copiar, em que se transcreviam partituras, se reproduziam cartões perfurados dos rolos das pianolas e se gravavam LPs em fitas cassete. Em nenhum desses casos havia o furto de um objeto, o “menos um” em uma prateleira de loja. Talvez por essa razão nada disso era considerado ilegal, mas também porque a indústria cultural conseguia criar seus ídolos e vender seus produtos.

Pode-se dizer que no mundo dos átomos todos eram felizes. Entra o mundo digital e as relações mudam. No mundo dos bits também não há o roubo físico de CDs e blu-rays das lojas, mas a cópia do original. Essa facilidade de copiar sem perda de qualidade qualquer bem cultural digitalizável e a vasta disponibilidade de conteúdo na internet assustaram os produtores de Hollywood e a poderosa indústria fonográfica norte-americana.

A sopa de letras (desculpem o paradoxo) dos atuais projetos de lei norte-americanos que eles apoiam – a Sopa e a Pipa – é mais uma tentativa de combater o compartilhamento de material protegido por direito autoral, quem sabe a definitiva.

O que precisa ser visto é que nem todo download, porém, traz prejuízo. Como afirma o renomado advogado estadunidense, Lawrence Lessig, não afeta os produtores de conteúdo baixar, por exemplo, material já disponibilizado gratuitamente pelos próprios autores (como é o caso de Paulo Coelho), de produtos que não estão mais em catálogo, de conteúdo que não é vendido em nossa localização geográfica, como muitos mangás e animés ou o download de amostras de canções para posterior compra (vejam os sites de vendas de MP3).

Do ponto de vista econômico, embora possivelmente ilegal, não há nessa ação prejuízo na venda desses produtos. É preciso notar ainda que nossa cultura sempre foi livre, sempre tivemos liberdade de apropriação e de recriação de nossos valores e costumes. Foi daí que surgiram grandes nomes como José de Alencar, Chico Anísio, Evaldo Gouveia e muitos, muitos outros que de certa forma copiaram alguma coisa de seus antecessores, sim, mas acrescentaram muita, muita dose de criatividade e inovação. Nas novas leis, a cultura da permissão e do medo imposta por parte da indústria cultural pode levar exatamente ao fim da criação. O que é preciso é uma lei que proteja o autor, que garanta seu sustento com a propriedade intelectual, mas que não iniba o criador e fomente a inovação.

E pensar que esses mesmos donos de Hollywood foram veemente contra o videocassete em seu início, como dispositivo em potencial de quebra de direitos autorais. Isso parece irônico quando se vê o número de filmes vendidos nas lojas. A pirataria deve ser combatida sim; a criatividade, não. Quem sabe se voltarmos a copiar tudo em fitas cassete deixarão de nos taxar de ilegais.


*Riverson Rios. Coordenador do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Ceará (UFC)
..

Nenhum comentário :

Postar um comentário

Veja aqui o que não aparece no PIG - Partido da Imprensa Golpista