domingo, 22 de novembro de 2009

Contraponto 774 - "Sem clima para salvar o clima"

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22/11/2009
"Sem clima para salvar o clima"

Carta Capital - 20/11/2009 13:48:43

Delfim Netto

Não há clima para salvar o clima na cúpula de Copenhague. Ponto. Toda aquela gigantesca expectativa de que se iria pavimentar um acordo agora em dezembro, limitando a emissão de CO2 para que a Terra aqueça “apenas” 2% até 2020 (o Plano 450), desmanchou-se no ar...

Estados Unidos e China honestamente assumiram, domingo passado, em Cingapura, durante o Fórum de Cooperação Ásia-Pacífico, a posição que não há tempo para costurar nenhum tratado com força de lei. Diante da indignação geral, cinicamente acomodaram-se. Deve-se agora esperar apenas algum tipo de comprometimento político de cortar as emissões. O G-2, formado pelos dois maiores emissores de gases de efeito estufa, decidiu que o mundo deve aguardar o ano que vem e nisso obtiveram a adesão dos demais dezenove países asiáticos presentes no fórum.

O Brasil discorda (a França também) e vai insistir com a proposta de redução voluntária de 39% das emissões até 2020. Confirma-se, no entanto, a desconfiança da maioria das pessoas de que os países ricos estavam determinados a transferir para uma próxima reunião, talvez em 2010, no México, quaisquer definições que os obrigassem a assumir metas de redução da emissão dos gases que aquecem o ambiente.

O problema é que são muito profundas as contradições entre os países, em seus diversos estágios de desenvolvimento, quando se trata do controle das causas do aquecimento global. A relação entre o crescimento do PIB e a produção do dióxido de carbono é praticamente linear. O aumento da produção de bens – seja na agricultura ou na indústria – aumenta a produção de dióxido de carbono e dos outros gases que produzem o efeito estufa.

Qualquer compromisso exigindo a redução de emissões envolve a preparação dos países para a utilização de energia alternativa renovável, de sorte a não prejudicar o crescimento da economia. Isso vai exigir um volume gigantesco de investimentos, dependendo do estágio de desenvolvimento de cada país e das possibilidades de aproveitamento das fontes energéticas. No Brasil, os investimentos até poderão ser menores, porque temos uma matriz energética muito privilegiada, em que praticamente a metade da produção de energia já é renovável, majoritariamente de fontes limpas, o que não acontece no resto do mundo, onde a média renovável não chega a 10%.

Desenvolvidos ou em desenvolvimento, esses países terão de providenciar alternativas para a geração de energia, explorando as fontes hídricas, a biomassa, o vento, o mar ou o sol, e construindo os novos sistemas de aproveitamento da energia geotérmica, eólica e solar. Antes da crise que arrasou os mercados financeiros em boa parte do mundo, muitos -países pareciam em condições de realizar os investimentos com seus próprios recursos ou financiando-se externamente. Hoje não se tem ideia de como cobrir os custos desses investimentos para a produção da nova energia, que vai permitir a redução do volume de emissões, a longuíssimo prazo. Foi por isso que os países reunidos na Ásia disseram que vão postergar por um ano os compromissos de reduzir a sujeira que produzem, frustrando de forma dramática os objetivos que se esperava atingir em Copenhague.

De seu lado, o Brasil tinha dado um exemplo, comprometendo-se a uma redução voluntária que, no fim, se transformaria num corte efetivo do aumento das emissões de poluentes. Isso implicaria poderosos investimentos que, provavelmente, não serão realizados, já que não devemos assumir esses compromissos numa ocasião em que cada um dos protagonistas está somente querendo empurrar para o outro a obrigação de fazer o serviço. Apesar dos esforços do presidente Lula e de seu colega Nicolas Sarkozy para salvar a reunião, insistindo com os presidentes Obama e Hu Jintao para que não deixem de ir a Copenhague, a sensação agora é de que não se chegará a nenhum compromisso mais sério.

Nos países desenvolvidos, não há sinal de mudanças na disposição dos Legislativos de assumir obrigações de reduzir as emissões dos gases que produzem o efeito estufa. Os congressistas (principalmente nos EUA), em sua grande maioria, não resistem aos poderosos lobbies, que defendem os interesses das indústrias, e dos setores da agricultura, que não aceitam restrições em seu modo de produzir. A não ser que receba garantias de fornecimento das energias alternativas renováveis e subsídios para investir na adaptação dos processos de produção, nenhum setor vai assumir qualquer compromisso de controle das emissões de dióxido de carbono.

Da mesma forma, entre os emergentes não há a disposição de fazê-lo pela simples razão que não podem arcar com os custos do controle das emissões, que exige investimentos gigantescos.
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