segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Contraponto 511 - "Entre quatro paredes? Não, é dinheiro público!"


19/10/2009
Entre quatro paredes? Não, é dinheiro público!

Tijolaço Brizola Neto- sábado, 17 outubro, 2009 às 15:51

Hoje, O Globo publica uma matéria onde ouve “investidores” (investidores, nada, executivos e advogados de empresas intermediadoras e redatoras de contratos de negócios) sobre a guerra da Vale, que vem de longe, mas agora chegou à páginas dos jornais e ao conhecimento de parte do povo brasileiro.

E olhe o que eles falam e aconselham: “essas desavenças entre sócios devem ser resolvidas entre quatro paredes” , “devem ser resolvidas no privado e não em público”. Vejam como é, no mundo dos negócios, que se trata de algo tão fundamental para nossa economia como o minério de ferro e a siderurgia. A população não pode ou não deve saber como está sendo usado o dinheiro que é dela - seja na composição acionária da empresa, seja nos bilhões e bilhões de recursos públicos que o BNDES injeta nas suas atividades.

E que atividades? O chefe de gabinete do Presidente Lula, Gilberto Carvalho, diz literalmente, na mesma edição do jornal, na coluna de Ilimar Franco, que a Vale não pode continuar a ser como “As veias abertas da América Latina”, que “o Estado não vai continuar financiando a exploração predatória”, que “ela não paga quase nada de royalties”, que “não pode deixar apenas crateras por onde passa”, que “se comprometeu (comprometeu, como, em créditos oficiais?) com projetos industriais, não cumpriu e se acovardou com a crise” e, finalmente, “que é muito fácil essa vida de vender minério brasileiro sem agregar valor”.

Acho que qualquer pessoa de bom-senso verá que coisas como essa não podem ser tratadas “entre quatro paredes”. Poderiam, se fosse o botequim do “Seu” Joaquim, com o dinheiro do “Seu” Joaquim. Mas não é, é uma riqueza que pertence ao Estado e cuja a exploração se dá por uma concessão. Mais ainda, se trata de uma empresa abarrotada de dinheiro do povo.

Portanto, não basta que o senhor Roger Agnelli, funcionário do Bradesco, que dirige a empresa da qual seu grupo só detém 9,1% de seu capital votante total e 21,2% do capital votante do grupo controlador vá visitar o presidente amanhã e prometa que, de agora em diante, vai pensar no país e no interesse público. Lula faz bem, conversar não tira pedaco e tudo o que de positivo vier é menos ruim do que aquilo que vem sendo feito.


Mas há uma questão da qual não se pode fugir. Que poder tem este sócio minoritário de dirigir uma empresa senão o que lhe foi dado pelos demais sócios?

E o que tem o Governo com isso? Bem, repare que a Previ é a acionista majoritária da Valepar, com 58% do seu capital total e 49% do capital votante. No total da Vale, ela é a maior acionista, com 23,5% do capital votante da empresa e perto de 15% do capital total. Quase o dobro do Bradesco de Roger Agnelli, portanto. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social Participações (BNDESpar) tem outros 12,5 das ações com direito a voto. Ambos, portanto, são maioria folgada dentro da controladora.

Mas a Previ não é um fundo dos funcionários do Banco do Brasil, similar a uma empresa privada? Não, não é. A sua formação de seus fundos vem, predominantemente, de contribuições da empresa estatal que a patrocina - no caso o Banco do Brasil - complementada pelas contribuições de seusservidores. Por isso, existe uma lei, a Lei Complementar 108, de 2001, que determina que a direção destes fundos de pensão terá metade de seus integrantes escolhidos pela empresa estatal - leia-se, pelo Governo - inclusive o seu presidente, que terá o voto de desempate. Portanto, em última análise, é o Governo quem decide como estes fundos investirão, dentro de critérios técnicos, claro.

Mas esse poder é muito maior. Diz o artigo 29 daquela Lei que os fundos “não poderão exercer o controle ou participar de acordo de acionistas que tenha por objeto formação de grupo de controle de sociedade anônima, sem prévia e expressa autorização da patrocinadora e do seu respectivo ente controlador”. Isto é, não podem fazer ou manter um acordo para entregar o controle da Vale ao Bradesco sem autorização do Banco do Brasil e de seu ente controlador, a União, através do Ministério da Fazenda.

Portanto, o Governo não tem apenas o direito, mas a obrigação legal de examinar a conveniência do acordo que entregou o controle acionário da Vale ao Bradesco. E a população, diante das afirmações do chefe de gabinete de Lula, tem o direito de saber porque, quando e quem se aprovou um acordo para fazer esta política que Lula condena com tanta veemência - e, no meu ponto de vista, coberto de razão.

Não se trata de intervenção, reestatização, pressão. Trata-se do cumprimento da lei - que , aliás, foi editada por Fernando Henrique Cardoso e quenão digam que é intervencionista ou estatista - e de saber quem, quanto e com que compromissos - que Gilberto Carvalho diz não terem sido cumpridos - foram entregues a ela recursos públicos da ordem de uma dezena de bilhões de reais.

É por isso que, como registra, hoje, a coluna de Ancelmo Goes, começo a coletar esta semana assinaturas para a criação de uma CPI destinada a esclarecer estes assuntos. Esta história de resolver “entre quatro paredes” pode servir para aquele botequim do “Seu Joaquim”, com o dinheiro dele e de seus sócios. Não para uma empresa que está sendo admininstrada com sócios majoritários que são entes públicos, tanto quea Previ tem de prestar contas ao TCU.

Espero que a oposição, que se mostrou tão ciosa da moralidade e da correção dos investimentos de uma empresa pública como a Petrobras - onde, aliás, o Governo tem mais ou menos a mesma participação no capital total que na Vale - não se recuse a colaborar com o esclarecimento dos fatos. Pode, inclusive, pela presença de ex-integrantes do Governo FHC na diretoria atual da Vale, ajudar a esclarecer o que está ocorrendo.

Vamos ver se moralidade e interesse público valem de um lado só.
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